sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

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A Familia dos Javalis
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Esta é a mãe Javali
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Este é o filho Javali

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Este é o pai Javali
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e estes?!
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...pois, eu ainda não sei, nem percebi.
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Desenhos da autoria do pequeno Miguel.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008



Simplesmente isso:
uma mulher
entrou no mar
e foi fertilizada
enquanto as espumas
carregavam
para bem longe
a notícia.


Segredo - Iara Vieira

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Blinky Palermo, sem nome, 1970.

É doce morrer no mar
nas ondas verdes do mar
...
A noite que ele não veio foi
foi de tristeza para mim
saveiro voltou sozinho
triste noite foi para mim

saveiro partiu de noite e foi
madrugada não voltou
o marinheiro bonito
sereia do mar levou

nas ondas verdes do mar meu bem
ele se foi afogar
fez sua cama de noivo
no colo de Iemanjá

É doce morrer no mar
nas ondas verdes do mar

Uma música nova para sacudir o estaminé, já que os tempos não estão para outra coisa.
Embora longe do candomblé e da ideia poética de morrer nas ondas do mar (sejam elas verdes ou azuis), afastando o pragmatismo para um canto, sinto a poeticidade sublime deste texto, a lembrar o fado.
Porque a tristeza também é bela e em momentos como estes pode serenar-nos.
É por tudo isto que sinto e não sei explicar que gostava de ser poeta, mas a minha veia artística secou cedo, definitivamente, e o meu jeito para as palavras nunca foi grande espingarda.
Ou então fui eu que sequei, como o bacalhau.
Também pode ter sido…
um mergulho então até que nem ia mal.

domingo, 24 de fevereiro de 2008


Vanessa Beecroft, VB61, 2007.

Temos dias que não sabemos que caminho levar, como caminhar. Como se estivéssemos num deserto árido, a partir de um ponto sem marcas no chão, nem à frente nem atrás. Como se o tempo e o vento estivessem sempre contra nós, poeira nos olhos, e o corpo fervilhasse de raiva. Raiva de querer viver.
Sweeney Todd: O Terrível Barbeiro de Fleet Street, Tim Burton (realização), 2007.

Trata-se do universo imaginário de Tim Burton, sem dúvida, com excelentes interpretações, do seu actor fetiche e de Helen Bonham Carter, mas por favor… tanto sangue?!
Não havia necessidade!

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Kasimir Malevich. Quadrado Preto e Quadrado Branco, 1915.
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À supremacia do puro sentimento…
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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

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Dão-se
M I M O S !

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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008



Silvia Levenson
It's Raining Knives
1996-2004, cast glass, artificial grass, nylon line.



Probably much still remains
To be celebrated by my voice:
That which, wordless, rubles around,
Or in darkness grinds stone underground,
Or makes its way through smoke.
I haven’t yet closed my accounts
With flame and wind and water…
Because of that, my drowsiness
Suddenly flings wide such gates to me
And leads beyond the morning star.

1942
Tashkent
Anna Akhmátova


segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008



Sherrie Levine, Black Newborn, 1994, Vidro, Casted and Sandblasted.


Passo pelos os dias como uma pedra, imóvel, informe. Uma pedra seca, sem brilho, longe da rebentação das ondas do mar.
Deixem-me estar, sedimentando-me, incrustando-me neste cimento que são os dias silenciosos de aragem fresca e sol de trovoada, de noites geladas e manhãs de orvalho frio e luminoso.
Gosto deste silêncio e do cantar do mar e do vento, da água correndo a pele das falésias, da neblina salgada que se põe ao fim do dia, do salitre que oxida o ferro.
E só gostava que a vida fosse assim, simples, e que corresse tão devagar como as primeiras horas da manhã.
Escuto-me. Sei-me perdida por aqui e todos os meus sentidos procuram. Eu caminho a um passo de mim, e por enquanto caminharei assim, até que um dia me acorde dentro.
Sem pressa de chegar.


domingo, 10 de fevereiro de 2008



The sky’s dark blue lacquer has dimmed,
And louder the song of the ocarina.
It’s only a little pipe of clay.
There’s no reason for it to complain.
Who told it all my sins,
And why is it absolving me?..
Or is this a voice repeating
Your latest poems to me?

1912
Anna Akhmátova

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

M. C. Escher - House of Stairs

1.

Já me ensinaram que o sol
Não morre. Eu acredito
Na noite (o meu coração morre às escuras)

2.

É verdade que acredito no homem
Que não fala (no homem que comunica
Com as mãos). Acredito
Na dor reveladora das coisas decepadas

3.

É verdade que estou muito triste
Na terra (já me indicaram a estrada
Com luz pública). Estou sentado nos degraus
Como alguém que parou de subir

Daniel Faria, do livro Dos Líquidos.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008




Há certas alturas em que me salta a tampa e fico sem saber se tenho ou não tenho razão para ela me saltar.
O que é que se faz/chama a alguém com quem não se tem qualquer tipo de confiança e com quem só se falou uma ou duas vezes, que nos manda mensagens sobre assuntos profissionais para o telemóvel pessoal, às 11h da noite?! Que raio de conceito de urgência saloia tem esta gente que se julga no direito de nos incomodar fora de horários minimamente aceitáveis?!
Juro que tenho alturas em que penso que há pessoas que, ou são meio malucas, ou são muito mal formadas, e se julgam no direito de dispor da vida das outras pessoas a seu belo prazer.
É que há pessoas que devem julgar que temos a obrigação de estar disponíveis 24h por dia e aos fins-de-semana, se for preciso. Qd não nos apanham no telemóvel de serviço, vai-se lá saber como, arranjam os contactos pessoais e toca de chatear a toda a hora.
Irra!
Ah pois é minha querida, no melhor pano cai a nódoa!
Os que deveriam ter a obrigação de ter mais tino na cabeça, são os piores!
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Com isto tudo já perdi a vontade de copiar para aqui mais um poemazito, que assim ficará para amanhã.
Vou para ali respirar fundo, ver se não hiperventilo e se amanhã acordo sem úlceras no estômago.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008



Daniel Faria, para mim, é como o mar. É onde gosto regressar quando preciso de me deixar perder, desprender, desnudar…

[...]

Tornei-me peso
Rochedo respirando para dentro nos líquenes interiores
Peso da ceguez nos meus olhos contaminados
Das pupilas inquinadas pelas pedras interiores

Tornei os olhos muito impuros por milhares de imagens
Pedras internas golpeando-me
Tornei-os incapazes das visões
Das visões interiores e por fora
Da aparência
Afoguei os olhos no meio das águas
Um peixe cheio de canais mudando as suas cores
Doendo-me muito nos olhos cobertos
Por escamas

Quis abrir os olhos no meio das águas no meio das imagens
E estava cego, estava coberto de fantasmas
Quis respirar com as mãos na garganta, guelras acesas
Porque as imagens não tinham rostos nas janelas

Elas fecharam-se sobre os meus olhos, em cardume,
Elas apontaram-me aos olhos as antenas interiores
Elas propagaram-me um modo cerrado de não ver

Dinamitei depois tudo o que em mim tinha forma de aquário
Um aquário sem nada dentro dele, dinamitei de vazio
Aquilo que na transparência tinha material explosivo
Uma força concreta, a capacidade de um cenário
Devastado

E dinamitei o vazio e encontrei um peso
Humano que não se afundava:
Era um milagre como Lázaro vindo para fora!
Era um homem que nos levava por um caminho desconhecido para casa
E que partia o pão. E eu vi que era ele
Que partia
O pão.


[...]

Excerto do poema “Mas basta-me um quadrado de sossego”do livro Homens que são como lugares mal situados.
Daniel Faria

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Amadeo Modigliani - Seated Nude

Esta semana, numa das minhas deambulações e intermezzos à espera de um determinado tempo, então a fazer tempo e não querendo perder gota dele, entrei numa livraria.
É em locais como este que ultimamente, quando posso, me perco e invisto o meu tempo, que de outra forma sairia desperdiçado.
Agora pareço até ter tempo para me perder assim, porque o encontro com a literatura (como com a música – não tanto as artes plásticas, embora, por vezes, também aconteça) é mais intenso e verdadeiro quando só, com tempo, porque é preciso fazer um intervalo com um princípio e um fim para entrar numa livraria e pegar em livros, sem necessidade de dar atenção a mais nada senão às palavras e lá no subconsciente às horas que ainda hão-de vir, lá ao longe. Ou então não é preciso nada disto, mas apenas estar, inteira, e receptiva.

Encontrei num escaparate uma pequena antologia de poesia russa, editada pela Relógio d’Água.
Há já algum tempo que andava encantada com as obras de alguns poetas russos, nomeadamente o Maiakovski (a razão da minha procura por mais), o Pasternak e a Anna Akhmátova, razão pela qual trouxe o livro para casa.
No fim-de-semana calhou, por entreposta pessoa, conhecer alguém que também partilha do gosto pela poesia russa e que tem várias obras traduzidas para o Inglês e Francês. Foi assim que me vi com as obras completas de Anna Akhmátova nas mãos, numa edição em inglês, à qual me rendi e me entrego sem reserva.
Na verdade, tenho de confessar que não gostei da antologia que comprei, muito menos da tradução, razão pela qual vou partilhar alguns dos poemas que vou gostando, numa língua que não é a minha, mas que tomo de empréstimo sempre que necessário (não me atrevo a traduzir porque não sei. É preciso saber-se.).

I live like a cuckoo in a clock,
I’m not jealous of the forest birds.
They wind me up – and I cuckoo.
You know – such a fate
I could only wish
For someone I hate.

March 7, 1911
Tsarskoye Selo



I wept and repented.
If only thunder would burst from the skies!
My heavy heart was exhausted
In your inhospitable house.
I know the unendurable pain,
The shame of the road back…
Terrible, terrible, to return
To the unloved one, the silent one.
If I bend over him, beautifully dressed,
Necklaces ringing –
He’ll only ask: “My incomparable beauty!
Where were you praying for me?”

1911

domingo, 3 de fevereiro de 2008

Amadeo Modigliani, Anna Akhmatova.


N.P.
And that heart no longer responds
To my voice, exulting and grieving.
Everything is over… And my song drifts
Into the empty night, where you no longer exist.

1953
Anna Akhmatova

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So many stones have been thrown at me
That I’m not frightened of them anymore,
And the pit has become a solid tower,
Tall among tall towers.
I thank the builders,
May care and sadness pass them by.
From here I’ll see the sunrise earlier,
Here the sun’s last ray rejoices.
And into the windows of my room
The northern breezes often fly.
And form my hand a dove eats grains of wheat…
As for my unfinished page,
The Muse’s tawny hand, divinely calm
And delicate, will finish it.

June 6, 1914
Slkepnyovo

Anna Akhmatova