Tenho os quadros no chão. Um monte de telas e molduras com colorido e textura encostadas à parede, esperando. Caixotes de cartão, pouco tempo para os movimentar, e pó.
Estou cansada. O dia correu bem. Está mais uma etapa vencida com sucesso.
O cansaço faz-me baixar à terra, assentar os pés e desarmar, repensar, “retrospectivar”, se é que este verbo existe, o sentido. É estranha esta sensação, de esvaziamento, de nudez, de desprendimento, de desenquadramento racional.
Apetecia-me cair, assentar, ameigar-me onde já fui feliz. Um microcosmos pulmão e sangue.
Mas as tempestades passam, e à sua volta deixam um rasto de destruição. Com elas levam, por vezes, os lugares onde já fomos felizes. Deixam esta sensação de despojamento e de melancolia.
Sinto saudades. Um sentimento de desenraizamento, de pertença estranho, como se algures tivesse deixado uma parte, uma parte significativa, desprezada e maltratada, mas que é nossa.
Deixei.
O cansaço quebra-nos a vigília, a vontade. A nostalgia apodera-se do pensamento. Ou não sabemos muito bem o que se apodera da razão. Sabemos que algo se apodera de qualquer coisa. De repente o mundo muda de sítio e o peito fica pequeno.
Contra isto, uma noite de sono, um sonho, e esperar que o verão passe depressa.
Dizia eu que tenho os quadros no chão, a paixão encerrada num traço, num ponto final.
3 comentários:
tudo isso é normal qd a casa seja ela qual for é vivenciada em tudo o q aconteceu lá dentro;
outras paredes trarão mais histórias,afinal é assim mesmo, são os pontos finais, as linhas rectas as descontínuas e as reticências, até ao dia em a linha ondulada vai se esticando numa só direcção formando um círculo,completo, até lá há q saber viver, desenhando prioridades e seleccionando os q nos queiram acompanhar nessa tela. a tela!
e as vivencias têm que ver com a intensidade com que os problemas nos afectam, os “agentes” que nos infligem algo, os ambientes, as preocupações, seja positiva, seja negativamente.
Uma coisa é certa: qd os fantasmas que nos atormentam e muitas vezes derrubam passam à história e desaparecem, quando as cortinas negras se abrem e desaparecem, a casa ganha uma nova luz, um novo ar limpo, de novo clareza, leveza, nessa altura apercebemo-nos do espaço vazio, da corrente de ar, do que antes, à custa de tanta confusão e ruído, à custa de tanto negrume denso, nem demos que tínhamos, ou não demos importância, ou não conseguimos manter dentro.
a sensação é a de que agora tenho de aprender tudo de novo, tenho de voltar a construir e a preencher o espaço, com aquela imagem do que se quer, mas nunca conseguir igual, porque igual não existe. Igual ao que já foi…
a tela, deposição/sobreposição de camadas de cor… é isso, a metáfora.
boas férias :)
é sim, eu percebo
um abraço
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